As suas manhãs são tarefa árdua. Ao abrir dos raios
de Sol, a Isabel vence sempre, já de cara lavada e parcos agasalhos, deambulando
ainda ensonada pela cozinha, onde seis tigelas e colheres de sopa são dispostas
sobre a mesa que aguarda os seus ocupantes. As madeixas soltas, ainda
desalinhadas são colocadas por detrás das orelhas pequenas, descobrindo os
olhos saturados, na tentativa de perceber melhor as intenções das suas mãos.
A cafeteira de leite é colocada à presa sobre o
fogão cujo bico insiste em não se acender sob as enérgicas tentativas. E quando
finalmente deixa de resistir, Isabel encaminha-se para o corredor, onde dá som
à sua voz matinal:
- O pequeno-almoço está pronto!
O marido e os quatro filhos encaminham-se para a
divisão, o marido despreocupado, a filha mais velha com o irmão mais novo ao
colo, e os dois do meio atrás, único lugar onde todos se encontram e onde Isabel
dá instruções acerca dos longos e melancólicos dias. O cansaço redobra logo ali,
deixando-a indisposta e revoltada.
Rapidamente engole os cereais, enquanto enfia colher após colher na boca do mais novo, que desde sempre resiste aos alimentos, já a desprender-se
do velho roupão de moletão rosa. Segue para a casa de banho, de onde,
terminada a sua higiene, sai já vestida e pronta. Passa pelos quartos e puxa as
orelhas às camas. Sob os seus gestos, as roupas das crianças deslizam sobre os
corpos frios de bocas a tiritar. “Tenho que comprar o maldito aquecedor.” O seu
pensamento foge momentaneamente para a loja de eletrodomésticos do Sr. Tadeu,
onde acumula prestações.
Coloca as mochilas nas costas dos dois do meio,
incitando-os a dar a mão. Pega no mais pequeno. A mais velha, com apenas sete
anos, segue os seus gestos, pronta a ajudar a mãe no que for necessário.
- Vá! Vão dar um beijo ao Pai!
As três crianças mais velhas entram na sala, onde o
Pai se encontra já instalado no cadeirão, de comando de televisão na mão. A sua
reação ao afecto dos filhos é fria. Profere apenas um “Até logo”.
Isabel baixa a criança que tem ao colo para que o marido lhe deposite um beijo
na testa. “Se pelo menos levantasses o rabo para me ajudar…”
- Não te esqueças do levar o lixo. E é melhor comprares apenas oito
carcaças hoje. Até logo!
O mais certo é o
saco do lixo ficar onde está…
Sai pela porta,
em direcção à escola ali mesmo em frente. Ainda passa pela ama, antes de correr
para o autocarro já quase a partir.
Mãe e Filho, Pablo Picasso
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