segunda-feira, 24 de junho de 2013

DÉCIMO TERCEIRO EXERCÍCIO (quinta semana)

Nem por acaso... 

Estive a escrever sobre o Amor no meu Blog "Quando os Passos São Maiores que a Vontade..." 

A seguir abro o livro da Margarida ("Escrita em Dia") para mais um exercício, e percebo que não me vou distanciar do tema...

Aqui fica. Respeitando as habituais regras impostas - afinal é uma sugestão, um exercício. O fascínio reside em o conseguir ultrapassar. Mas não vou dizer quais são as regras. Revelaria de mais...

De: André Milhas
Para: Clara Duarte
Assunto: Não o consigo referir...

Jamais lhe dissera onde estava... Não queria que ela sonhasse com aquilo... com aquele lugar... que ela soubesse...

Mas estava prestes a sair. Um perdão! Não cumprira o tempo, por causa daquele perdão. Condicional, mas livre. Todavia, não imaginava o que o poderia esperar para lá dos muros. Quando as pessoas soubessem o que fizera, onde estiver...

Tinha que lhe escrever, despedir-se. Só precisava que os computadores estivessem disponíveis. Esperou... Vagou um.

"Clara, despeço-me assim de ti, por não ser capaz de o fazer de outra forma. Não consigo sequer começar a dizer-te a importância que tens tido para mim. Não teria conseguido viver esta aventura sem saber que estavas desse lado, a apoiar-me, a responder a cada um dos meus apelos contra esta solidão. Foi um verdadeiro desafio, este encontro. Acreditaste! E isso foi de um valor inestimável para mim. Esta hesitação em partir, foi apenas por tua causa. Mas hoje decidi-me. Não sei se algum dia voltarei a ter oportunidade de te escrever. Amanhã começa uma etapa totalmente nova para a mim. Algo completamente desconhecido... 
Agradeço todo o teu carinho. Agradeço toda a tua paciência. Mas devo dizer que não sou nem quem nem o que tu pensas.

Até sempre!"

Carregou em enviar e esperou. Não queria que a resposta entrasse, mas era provável que assim fosse. E nem cinco minutos passaram.

De: Clara Duarte
Para: André Milhas
Assunto: Sempre soube!

"Sempre soube quem tu és e onde estás, Paulo! Agora depende de ti... Eu estou fora desses muros, se quiseres, à tua espera..."



sábado, 22 de junho de 2013

DÉCIMO SEGUNDO EXERCÍCIO (quinta semana)

A partir de uma frase proposta e diliuída...

Outrora adepto de futebol, hoje folgava em se afastar. Rapidamente se habituou: a pasmaceira daquelas tardes agradava-lhe.

- Comprasta a Bola, hoje?
- Comprei!

E depressa as palavras viajavam, desejosas de se diluírem e transformarem, porque ali quem se esquecesse de sonhar, vivia uma adição de monotonias. O Malaquias acertou-lhe com o jornal.

- E não dizes nada do jogo?
- Há alguma coisa a dizer?!

Mas o silêncio reinstalou-se; e era irreversível. Recusava-se a descer. Antes nas nuvens, que a congeminar aquelas fugacidades. Do mundo nada queria. Todo o silêncio era ditoso. Meditava, silente.


Devagar recebeu o cesto, perdendo-se. Ah! Cheiros! Esquecia-se… A vida não podia ser mais simples!


Fim de tarde na aldeia...

quarta-feira, 12 de junho de 2013

DÉCIMO PRIMEIRO EXERCÍCIO (quarta semana)

CRISTIANA PÉ CURTO

Criar uma história para a Cristiana Pé Curto... personagem pré definida.


Não sabia lidar com aquele protagonismo. Tanta confusão em torno de si. Gente, microfones, aqueles pós no rosto e aquela mulher tão bem vestida que parecia tirada de uma daquelas revistas cor-de-rosa que se vendiam lá na papelaria da aldeia. Não havia gente assim por ali…

- Senhora Cristiana, vamos começar por filmá-la um pouco a trabalhar…
- Então não fizeram já isso?

A mulher sorriu, condescendente, denunciando uma ilícita superioridade. Não gostava de fazer aquelas entrevistas naquelas terriolas de fim de mundo. Nascera para voos mais altos. E aquela mulherzinha, coxa, velha, onde é que a tinham desencantado? Cristiana Pé Curto! Havia aquela mania nas aldeias, de pôr nomes às gentes, sempre a ver com algum defeito ou feitio. Que interesse podia haver numa octogenária coxa que levava as manhãs a mexer na terra e as tardes a fazer bonecas e casinhas?

- Filmámos a Senhora a trabalhar no campo, a tratar das árvores, a colher, a cuidar das galinhas, das cabras, dos porcos... Agora vamos filmá-la a fazer estas coisas – apontando depreciativamente para as bonecas de barbas de milho e tecidos velhos e para as casas de pedra e madeira – e a falar dos seus poemas…

- Está bem!

Sentia-se muito pouco à vontade. A Cristiana Pé Curto vivia ali, isolada, há tanto ano que não sabia lidar com aquilo. Veio-lhe à memória a partida dos filhos. Um após outro, tinham partido à procura de melhor, para o estrangeiro. Hoje, estavam divididos entre a Inglaterra e a Holanda. E lá vinham, separados, um ou dois dias por ano ver a mãe, umas vezes com os filhos, outras sem. De nove filhos (seis raparigas e três rapazes), vinte e quatro netos e já sete bisnetos (não conhecia nenhum dos últimos) se aquela casa se enchia dez dias por ano era muito. Houve um Natal… Ah! Um Natal cheio de alegria. Nem conseguira falar com os filhos para os avisar que aquela gente ia lá filmá-la e entrevista-la.

Mas não era fácil virem todos ao mesmo tempo, com os empregos e as escolas, e a vontade de conhecer outros lugares. Não havia nada ali para ver, além de árvores e plantas, e na aldeia mais próxima, uma papelaria, um pronto a vestir onde trabalhava a Etelvina – a modista -, uma mercearia e dois cafés – o do Santos e o do Tobias Zarolho -, onde o pessoal da aldeia se juntava nas noites de verão, as mulheres para beberem um Capilé, ou uma Groselha, ou uma limonada, os homens, sendo homens, atacavam as cervejas, o copo de tinto, ou o bagaço.

Já nem havia bailaricos. Para quê? Não havia gente nova para dançar. Ia tudo embora, à procura de melhor. As festas da aldeia já há muito que tinham passado de cinco a um dia.

Ainda se lembrava de ir aos bailes com o marido e os filhos, vestidos com as roupas domingueiras, muito bem penteados – sim que a Cristiana sempre tivera brio na higiene e boa aparência da família -, todos apinhados na carroça, puxada pela Mila, a primeira mula que tiveram. Era uma bicha forte, aquela, e durou tantos anos, sempre a trabalhar. E o marido… Já nenhum dos filhos estava por lá quando o Leopoldo falecera. Saudades…

- Vamos a isto, Senhora Cristiana? Vai ver que qualquer dia está aí pelas feiras do país a vender as suas bonecas e casinhas. – O homem era mais simpático.
- Vamos lá, então…
- Quer ir cantando um dos seus poemas enquanto trabalha?
- Pode ser…

Sentou-se, cantarolando e costurando as vestes das duas bonecas que jaziam despidas em cima da mesa de trabalho, a mulher bem vestida sentada ao seu lado, a fazer perguntas sobre tudo e mais alguma coisa, a camara de filmar ora a fazer grandes planos das suas mãos e do que ia fazendo, ora do seu rosto, entregue à canção e às respostas.

"A Mãe", Ricardo Bezerro

segunda-feira, 10 de junho de 2013

NONO E DÉCIMO EXERCÍCIOS (quarta semana)

No máximo uma palavra entre cada duas palavras obrigatórias.

Assentou pés, ansiosa por saber dos assuntos todos. Mandatária, tirou conclusões momentâneas. A todos importava nada mais... Apenas o testamento. Tinha certeza! Iria ser árdua tarefa.

Assim seja! Aprendi bem! Fácil!

Ganhou fôlego, limpando caminho, antecipando as dificuldades levianas.

E agora, refazer o texto, com total liberdade... Mais ou menos...

Mal assentou os pés na sala, percebeu todo o antagonismo presente. Rostos cerrados, de bocas de lábios finos, entesados pelo advento agora em curso. Sentia-se ansiosa. Queria saber tudo, os assuntos todos pendentes. 

Tinha uma ideia acerca de cada um... Nada definitivo. Sabia de toda a negligência para com a testada, e como as invejas minavam aquelas desalmas. Mandatária, incumbida da tarefa de ler o testamento em que ela mesma estava incluída, tirou as suas conclusões momentâneas.

A filha mais nova, mantinha-se  de pé. Preocupada em manter o vestido impecável sem uma única ruga, ciente da sua elegância e do valor dos seus trajes dispendiosos. O marido, de uma beleza e vaidade incontestáveis, mostrava-se impiedosamente concentrado na pasta que a testamentária segurava. A outra filha, viúva, desprovida de qualquer interesse, manejava, aparentemente calma o pequeno colar de pérolas antigo. Os dois filhos, homens, permaneciam impávidos e ávidos. Não disfarçavam o interesse naquela sessão. A filha do meio mostrava-se audaz e desfeita de preconceitos. Solteira, era incapaz de aceitar a união sagrada das irmãs. Embora calma, e de vestes simples e desaprovadas pelas irmãs, fazia do bater do chinelo de enfiar no dedo o único acompanhamento musical daquele momento. 

Conhecia bem aquelas aparências.

A todos importava nada mais... Apenas o testamento. Tinha a certeza que iria ser complicado. A tarefa iria ser árdua. Também ela - grande amiga da falecida, apesar da diferença de idade - estava incluída naquele testamento.

- Assim seja! Tive um bom professor! Aprendi bem! Sei manter-me imparcial... Vai ser fácil!

Tentava convencer-se, consciente dos obstáculos com que se  iria deparar. Retirou os documentos da pasta. Sentou-se à secretária, frente aos seus interlocutores. Ganhou fôlego. Procurou as palavras, limpando o caminho com um sorriso profissional... antecipando as dificuldades levianas.