sábado, 14 de junho de 2014

DÉCIMO NONO EXERCÍCIO

Os exercícios vão-se tornando mais difíceis, sem dúvida alguma... e eu tenho momentos em que acho que ando em círculos. Mas cá vai mais uma tentativa Margarida...

- Escolher um determinado grupo de palavras - de acordo com temas, sintaxe, etc...
- Construir frases, dentro de limites impostos, com essas mesmas palavras...
- Elaborar um texto a partir das frases conseguidas...

O texto:

Uma saída com o Alberto era – para basicamente qualquer um - motivo de alegria. O Alberto era um pleaser, e se desejava algo tornava-se socialmente ainda mais interactivo, agradável, meio meloso, atento a cada virar de esquina, a cada longa recta. O incrível é que tudo com ele era uma constante verdadeira surpresa… e a Elisa questionava-se sempre: Como?

Ele levava-a onde menos esperava… Se se preparava para ir dançar, acabava numa tasca a ouvir fados e a beber ginginha; se se preparava para uma exposição, acabava a dançar numa discoteca; e se se preparava para a tasca, acabava na ópera… Com o Alberto, a vida era uma incógnita, um esvoaçar pelo vento da liberdade, rasando tenuemente a irracionalidade.

- Onde vamos? Estou vestida para a ocasião?
- Muito vestida para a ocasião…
- Eu acho que tu só decides onde levar-me depois de veres como me preparei…

O Alberto beijou-lhe suavemente o rosto, despejando um leve sussurro, quente e protector…

- Gosto de ti de qualquer maneira…

Deslizou, encantada, pela exposição. Sentia-se reavivada. As pinceladas alheias nas mais variadas telas tinha um efeito devastador sobre a sua psique. Perdia-se na contemplação das cores, da neutralidade ou tempestividade dos artistas, sentia na pele as mensagens.

Ele alcançou-a.

- Toma…
- Um livro?
- As biografias e obras dos artistas participantes.

Sorriu de volta para ele, como uma criança sorri, divertida ao receber um presente.

- Alberto, gosto daquela tela! Parece estar viva!

Avançou na sua direcção, prospecto da exposição numa mão, livro noutra – mostra da sua documentação sobre o evento; mostra do seu apreço.

- Não sei! Olho para ela e sinto-me envolvida… sinto-me feliz… sinto-me liberta… e ao mesmo tempo presa: não quero fugir da felicidade…
- Tu enfrentas tudo na vida com essa mesma paixão… ficas a olhar uma gota de água a escorrer pela janela, desde que ela lá se apresenta até ao momento em que ela se desfaz no caixilho, misturando-se com outras…
- Fazes-me parecer louquinha! – ele sorriu – Sabes que a minha paixão é de astrofísica!
- Claro! E arte moderna, contemporânea, e livros, todos os livros, e música, toda a música… e claro está, o imenso e inesgotável Cosmos…

Fingiu ignorá-lo...

- No que respeita a arte, prefiro a clássica: todos aqueles adónis e venús… toda aquela perfeição mítica… toda aquela exposição simplista, desprovida de pudor, ardente de apreciação…

- Pois claro! – selou-lhe os lábios com um beijo…

domingo, 8 de junho de 2014

DÉCIMO OITAVO EXERCÍCIO (oitava semana)

Estive meses sem voltar aos meus blogs! Senti-me "bloqueada".

Em relação ao "Imagine" não consegui - na altura - dar a volta ao exercício que me era proposto. Achei por bem parar... e confesso que a vontade - até a necessidade de continuá-lo (o "Imagine") tardou. 

Mas cá estou! A retomar o exercício próximo, proposto em "Escrita em Dia". E Não é fácil. Tinha um texto: dentro de determinadas regras, devia reescrevê-lo... Aqui fica a minha tentativa...

O original:

A cozinha estava fria e escura, mas não ligou a luz. Sabia as distâncias de cor, fazia os movimentos sem pensar. Tudo no sítio, sempre arrumado, sem surpresas. Pelo menos sabia que assegurava essa parte da vida com êxito. Sabia de outras mulheres da sua idade que se abandonavam ao desmazelo, mas ela não. Contudo, para dizer a verdade, fazia tudo sem grande entusiasmo, apenas para sentir que o abandonar dessas preocupações significaria o início da derrocada.

O texto reescrito:

Sem grande vontade, avançou. Pelo menos conhecia a vida, sempre escura e fria. Mas a luz, não a ligou. Sabia a verdade de cor, sem surpresas… Estava preocupada. Contudo, fazia os movimentos, as distâncias, sem pensar abandonar. Outras, de que sabia – da sua idade – abandonavam-se ao ócio, com êxito… Mas ela não! Fazia tudo o que assegurava essa parte, apenas para sentir que arrumado o espaço, tudo no sítio, significaria o início da derrocada dessas mulheres.



domingo, 21 de julho de 2013

DÉCIMO SÉTIMO EXERCÍCIO (sétima semana)

Retrato de personagem; interacção; apenas os pensamentos das personagens (divertido).

Gisela, de 25 anos, editora. Insegura, desajeitada, sempre envolvida numa personagem que afasta os olhos alheios do seu verdadeiro ser. Anseia aceitação na editora, mas tem receio de avançar na carreira e de não dar conta do recado. Tem uns maravilhosos olhos azuis que passam despercebidos por detrás dos óculos que a protegem do astigmatismo. Os cabelos escuros são longos e não variam além do rabo-de-cavalo preso na nuca e do solto. Calça um sapato de salto pela primeira vez na vida: quer começar a sentir-se mulher. Mas o seu andar é desajeitado.

Momento de viragem - Passa no corredor no momento em que o Tadeu - jovem das limpezas -, encera o chão de soalho de madeira. Ele agrada-lhe, mas ela não conhece o mundo das conquistas. Os olhos negros de Tadeu derretem-na. E hoje de saltos, caminha insegura.

Gisela Bolas! Caramba! Não podias estar a encerar uma das salas?! Como é que eu passo aí a fazer esta figura? Já me doí a barriga das pernas!
Tadeu É pá! Saltinho alto hoje. Está mais desengonçada que uma vara ao vento. A miúda é engraçada. Quer tornar-se mulher, é o que é! Até era capaz de lhe dar uma ajuda…
Gisela Respira fundo que estás quase a passar por ele. Vá! Equilíbrio! Só mais um pouco e entras na tua sala. Ficas safa!
Tadeu Vou-me meter com ela. Vai ser giro! Vai ficar toda atrapalhada!
Gisela Por favor! Ó meu Deus! Tira lá a raça da máquina do caminho. Ainda tropeço nessa porcaria. Raios!
Tadeu Ó que desajeitada. Agora tenho que ajudá-la a levantar-se do chão. Só me apetece rir! Contem-te. Não tem graça nenhuma pores-te a rir na cara da miúda.
Gisela Ó Santo Deus! Porventura achará que não me consigo levantar do chão sozinha. Tira-me lá as mãos das ancas. Consigo equilibrar-me! Deixei cair a porra dos óculos. Onde é que estarão? Ele está a apanhá-los. Aí se este diabo conta a alguém! Deixa-me lá pôr direita. Dá cá mas é os óculos. Não estou para delicadezas. Ai os olhos deste sacana. Parecem mel!
Tadeu Eh! Selvagem! Mal agradecida! Espera lá... Está bonito! Agora arrepio-me todo a olhar-lhe para os olhos. Nunca lhos tinha visto bem… Que azul, mano! Parecem o céu...
Gisela Tenho que ser eu a afastar-me?! Vá Gisela dos Santos! Entra na sala! Diabo da porta que não abre à primeira. Vá! Agora fecha a porta! Respira fundo!


quinta-feira, 18 de julho de 2013

DÉCIMO SEXTO EXERCÍCIO (sétima semana)

Nomes, anagramas, textos...

Inês Catita Efigénia

Gini! Senta-te e fica aí!

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Texto (50 palavras)


"Diabo da cadela! Não obedece!"

As tentativas amontoavam, e o desespero acumulava, transbordando no olhar entontecido da dona. Todos olhavam, uns divertidos com a indisciplina, outros tendentes a recriminar a veemência, ininterruptamente imposta na mesma ordem.

- Gini! Senta-te e fica aí!

Mas nada! Mal Dora virou costas, a Gini seguiu.


quinta-feira, 4 de julho de 2013

DÉCIMO QUINTO EXERCÍCIO (sexta semana)

Descrição do espaço... Obedecendo as devidas directrizes.





Madalena Fernandes, uma jornalista dedicada ao mundo intenso das artes, tinha agora em mãos umas das entrevistas mais esperadas da sua carreira. Segurava com força a sua mala de trabalho, onde canetas, lápis, blocos e gravador se misturavam, oferecendo companhia uns aos outros nos momentos de descanso.

Subiu as escadas, a excitação a toldar-lhe o raciocínio. Era tão raro a Sofia Boaventura dar entrevistas. Agora então, a idade avançada, as limitações impostas por esta... Tinha que dar o seu melhor e tornar aquela sessão numa simplificada tertúlia da vida de uma senhora brilhante.

Uma governante mostrou-lhe a sala onde deveria esperar, indicando-lhe um dos dois cadeirões de veludo vermelho dispostos em frente à lareira, onde o leve crepitar da lenha se destacava levemente, intensificando a frágil luz difundida pelas portadas entreabertas das duas enormes janelas da ampla sala. Sentou-se.

- Posso oferecer-lhe alguma coisa: um café, um chá, um refresco?
- Um copo com água fresca, por favor...

A governanta anuiu silenciosamente, atribuindo um sorriso dedicado. Saiu da sala, fechando a porta atrás de si, e deixando a Madalena só, entregue àquelas manifestações de uma superioridade delicada e única.

Deteve o olhar sobre o piano de cauda negro, e imaginou-o, silenciosamente, a vibrar as infinitas melodias nele reproduzidas. Levantou-se, movida pelo desejo de lhe tocar. Tocar-lhe trazer-lhe-ia certamente alguma ideia das suas vivências. Sentou-se sobre o banco, tocando timidamente nas teclas, ora nas brancas, ora nas negras, de olhos fechados, adivinhando cada som, sentido as vibrações percorrer a sala e quem nela algum dia se sentara para ouvir a Sofia tocar, embriagados de paixão pelo deslizar incomparável daqueles leves e brilhantes dedos. As pautas... Pegou numa peça de Bach, concerto para piano e ergueu-se tendo reconhecido as notas, maestrando a orquestra imaginária, enquanto o seu cérebro entoava a obra.

O seu calcanhar tocou em algo, causando um leve som de queda. Largou as pautas, depondo-as no seu lugar original e virou-se, encontrando três telas a óleo inacabadas, que haviam deslizado com o toque do seu pé. Ajeitou-se, lembrando-se de onde estava, repentinamente nervosa com a perspectiva de alguém a encontrar a tocar no que não era seu para tocar. Mas a tela no cavalete - essa sim, acabada - fez com que se detivesse novamente a observar o rosto retratado. Era um rosto jovem, extremamente feminino, de longos cachos de caracóis cor de ébano e de olhar perdido sobre o dourado campo de trigo que transmitia a ideia de movimento ao ritmo de uma leve brisa misturada com os leves sons daquela casta sala.

Retomou a sua caminhada pela sala, apinhada de pequenas valiosas coisas. As pequenas caixas de porcelana - provavelmente uma qualquer colecção - eram possivelmente oriundos de todos os cantos do mundo. De cores e formas diferentes, pegou em algumas, sentindo as texturas, umas ásperas, outras lisas, umas com finas imagens pintadas à mão, outras de uma cor lisa, outras com maravilhosos relevos. Não ousou abrir nenhuma, consciente do seu atrevimento em simplesmente tocar-lhes. Havia outros objectos, pequenas estatuetas, outras maiores, jarros, jarrinhos e jarrões, e o imenso leque de cores daquela sala principiou a deixá-la tonta de emoção, tal era a variedade de sons e imagens que imaginava, as viagens de que haviam resultado, as histórias que escondiam. 

Numa mesa redonda, deteve-se a observar as molduras de rostos desconhecidos: seguramente família e amigos. Pegou numa em que reconheceu a jovem Sofia, sentada sobre um banco de jardim, envolvida pelo abraço caloroso de um homem, também ele jovem, enquanto três crianças aparentemente agitadas pareciam debater-se por um lugar ao colo de ambos, todos com imensos e felizes sorrisos. Pousou novamente o retrato, invadida por uma alegria contagiante.

Caminhou na direcção das estantes. Deteve-se a contemplar as lombadas dos livros, engolindo cada título, cada autor: Milan Kundera, "A Insustentável Leveza do Ser", "A Vida Está Noutro Lugar", "O Livro do Riso e do Esquecimento", Tolstói, "Guerra e Paz", "Anna Karenina", "A Morte de Ivan Llitch", Charlotte Brontë, "A Paixão de Jane Eyre", Emily Brontë, "O Monte dos Vendavais", uma infinita panóplia de autores e romances que fizeram com que o pensamento de Madalena viajassa de encontro às grandes histórias de séculos passados, de tempos vividos em outras condições físicas, de acordo com outras vontades, desejos, objectivos. Pegou no exemplar de "As Brumas de Avalon - A Senhora da Magia", de Marion Zimmer Bradley, e abriu na primeira página, em branco, encontrando uma singela dedicatória, ardente de admiração pela actual dona daquele livro:

"Para a minha adorada companheira, Sofia, a verdadeira feiticeira de todos os meus sentidos, ao cabo de quarenta anos de união, no Amor e na Alegria. Amo-te!"

A porta abriu-se. Fechou repentinamente o livro e virou-se.

Óleo sobre tela
Escrevendo, Daniel F. Gerhartz

segunda-feira, 1 de julho de 2013

DÉCIMO QUARTO EXERCÍCIO (sexta semana)

Primeiro exercício relacionado com poesia. Este é um verdadeiro desafio. Um pouco à toa. Não me dou de pretensões a poeta... 

Obedece, este exercício, a um esquema, não transcrito. As minhas palavras terão que estar em acordo com as de um(a) poeta(poetiza) que escolho. Uns versos são meus, outros tirados das minhas escolhas. Assim me é pedido.

Escolhi Sophia (Sophia de Mello Breyner Andresen), porque a Sophia me enaltece, me dá voz, me faz mediatar, e querer ir além.

Perdido o meu olhar na distância difusa
O meu interior é uma atenção voltada para fora,
Num suspiro de desejo agoirado.
E a luz que nos rodeia é como grades
Que leva o pensamento insano, numa jornada
Com uma tão simples claridade sobre a testa.
Perde-se a vontade do real
E de mim se desprende a minha vida.



Poemas consultados:
"Hora da Partida"
"Retrato de Uma Princesa Desconhecida"
"Exílio"
"Poema"

segunda-feira, 24 de junho de 2013

DÉCIMO TERCEIRO EXERCÍCIO (quinta semana)

Nem por acaso... 

Estive a escrever sobre o Amor no meu Blog "Quando os Passos São Maiores que a Vontade..." 

A seguir abro o livro da Margarida ("Escrita em Dia") para mais um exercício, e percebo que não me vou distanciar do tema...

Aqui fica. Respeitando as habituais regras impostas - afinal é uma sugestão, um exercício. O fascínio reside em o conseguir ultrapassar. Mas não vou dizer quais são as regras. Revelaria de mais...

De: André Milhas
Para: Clara Duarte
Assunto: Não o consigo referir...

Jamais lhe dissera onde estava... Não queria que ela sonhasse com aquilo... com aquele lugar... que ela soubesse...

Mas estava prestes a sair. Um perdão! Não cumprira o tempo, por causa daquele perdão. Condicional, mas livre. Todavia, não imaginava o que o poderia esperar para lá dos muros. Quando as pessoas soubessem o que fizera, onde estiver...

Tinha que lhe escrever, despedir-se. Só precisava que os computadores estivessem disponíveis. Esperou... Vagou um.

"Clara, despeço-me assim de ti, por não ser capaz de o fazer de outra forma. Não consigo sequer começar a dizer-te a importância que tens tido para mim. Não teria conseguido viver esta aventura sem saber que estavas desse lado, a apoiar-me, a responder a cada um dos meus apelos contra esta solidão. Foi um verdadeiro desafio, este encontro. Acreditaste! E isso foi de um valor inestimável para mim. Esta hesitação em partir, foi apenas por tua causa. Mas hoje decidi-me. Não sei se algum dia voltarei a ter oportunidade de te escrever. Amanhã começa uma etapa totalmente nova para a mim. Algo completamente desconhecido... 
Agradeço todo o teu carinho. Agradeço toda a tua paciência. Mas devo dizer que não sou nem quem nem o que tu pensas.

Até sempre!"

Carregou em enviar e esperou. Não queria que a resposta entrasse, mas era provável que assim fosse. E nem cinco minutos passaram.

De: Clara Duarte
Para: André Milhas
Assunto: Sempre soube!

"Sempre soube quem tu és e onde estás, Paulo! Agora depende de ti... Eu estou fora desses muros, se quiseres, à tua espera..."